segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Óculos

Hoje tive uma experiência incrível, com uma daquelas coisas bestas, que nos fazem pensar em como tiramos grandes conclusões a partir de acontecimentos simples.
Caminhando, como sempre, sem rumo e destino, encontrei um homem baixo, de pele queimada pelo sol, com um jeito engraçado de nordestino, vendendo alguns óculos escuros. Daqueles baratos, que se dá pra criança pequena, sabendo que ela vai quebrá-lo. Como o sol era escaldante, e a feição triste daquele homem me convidara, comprei o mais barato dos produtos, com uns trocados que obtivera em algum canto de alguma pequena cidade fétida.
Finalmente o sol não brilhava com tanta força, os meus olhos e a minha cabeça não doíam com tanta intensidade, a poeira já não era um inimigo tão presente. Logo mais a frente, vi um homem estranho. Ele tinha chagas por todo o corpo. As marcas lhe eram evidentes. Não pude deixar de sentir muita pena daquele coitado. Deveria estar à poucos passos da morte, com alguma doença incurável. Ainda assim, senti medo, e saí de perto daquele homem. Ele, ainda assim, me parecera tão feliz, tão tranquilo em seus passos. Era de fato estranho.
Passei por uma casa, onde pude ver marcas profundas nas paredes, assim como nos rostos daquelas mulheres sofridas lá dentro. Pareciam perto da morte. Me senti em um vilarejo fantasma, onde todos estão em parte mortos, em parte vivos. Temi, e corri para longe.
Depois de alguns passos, um vento forte me arrancou os óculos do rosto. Ele voou longe, de modo que não conseguiria alcançá-lo facilmente. Olhei para trás, procurando de alguma forma reavê-lo. Olhei por mais um momento aquela pobre casa.
Dei um passo para trás. Senti um calafrio. As marcas naquela parede haviam desaparecido, assim como os rostos tomavam uma forma amigável e incrivelmente saudáveis.
E disso também tirei lição. Os óculos, que me foram vendidos por aquele charlatão maranhense estavam arranhados. Tudo me parecera ter a mesma forma. Aprendi que quando a lente é suja, tudo o quanto se vê torna-se sujo. E isso me surpreendeu (e me surpreende até hoje) deveras.

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